Desde 1837, quando passou a fazer parte dos “planos de estudos” das escolas públicas no Brasil, a disciplina de História vem enfrentando desafios, que se revigoram a cada geração. O primeiro grande desafio foi a formação de profissionais da área, que só se iniciou a partir da década de 1930. A disciplina de História nascia no Brasil e já encontrava em sua gênese um grande obstáculo a ser superado, entre tantos outros que se seguirão.
A grande transformação no estudo da História (que afetará sobremaneira a formação dos profissionais) ocorre somente no período pós-Segunda Guerra com a criação da Escola dos Annales. Consolidava-se uma relevante aproximação entre a História e as Ciências Sociais. De acordo com o modelo teórico dos Annales, apesar de haver uma espécie de osmose entre as diversas Ciências Sociais, os historiadores seriam os mestres dessa síntese.
Fernand Braudel, historiador francês e um dos mais importantes expoentes dessa escola, afirma que a História, nesse processo de fusão com as outras áreas das Ciências Sociais e Humanidades, deve absorver, assimilar e sair fortalecida como protagonista, pois o historiador lida com o essencial no estudo histórico, que é o tempo. Para Braudel a matéria-prima do historiador são os movimentos, variações, durações, rupturas e continuidades. Ao analisar todos esses processos o historiador não poderá fugir da pluralidade temporal.
O modelo teórico de Braudel, que analisa as temporalidades plurais, se opõe à História factual, que era presente no modelo positivista, até o início do século XX. A partir da observação desse modelo é possível perceber a relevância das diversas áreas do saber na construção das análises históricas, bem como a importância da compreensão das estruturas sociais, econômicas, políticas e culturais para uma análise mais completa.
Para Braudel os processos históricos se transformam a partir de três temporalidades: em primeiro lugar a história de longa duração, onde o ritmo de mudanças é lento, quase imperceptível. Ocorre a partir da relação entre Homem e o meio ambiente. Logo após há o tempo cíclico, pautado em ciclos econômicos, os Estados, as sociedades e as civilizações e como essas influenciam o desenvolvimento histórico. Por último há a história de curta duração, baseada em eventos políticos. As análises são baseadas em acontecimentos momentâneos, o que pode causar equívocos nas análises.
A partir da compreensão da teoria de Braudel é possível ampliar o espectro de análise dos impactos das transformações históricas na sociedade. A história factual tratava apenas de eventos isolados, ocorridos num determinado recorte temporal sem qualquer tipo de relação com o presente, sem contextualização e sem o contrafactual. A visão braudeliana afasta-nos do objeto analisado, permitindo-nos uma visão holística do processo como um todo.
A compreensão dos fatos do presente, bem como projeções futuras, passam necessariamente por essa visão ampla e abrangente. É fundamental que o conhecimento histórico seja produzido tendo como base as múltiplas visões expostas para que se possa compreender mais profundamente os processos de mudanças que sustentam as conexões entre os fatos históricos. Observando e analisando os
movimentos históricos com um método amplo e dialético como o modelo dos Annales, poderemos construir a História de um futuro mais sólido e com menos equívocos.
Valter Pereira
Professor